quarta-feira, 24 de setembro de 2014

coisas respondidas a coisas perguntadas...

Olá. A Nádia entrevistou-me para o blogue O Nosso Mundo Sobrenatural, e aqui fica um pedacinho da entrevista.

1º Manuel podes falar um pouco de ti, o que fazes, o que gostas e detestas.

Olá. Resumindo, posso dizer que nasci e tenho-me aguentado. Apesar das várias tentativas de assassinato da parte do Universo. Já escapei a uma asfixia (idiotices de crianças), a afogamento (duas vezes… aprendi a nadar um bocado tarde… mas não demasiado, felizmente), a um acidente de viação (capotar é divertido, mas não recomendo que se faça de propósito), e vou fazendo fintas às rasteiras da vida em geral. De resto, isto de estar vivo, e poder aproveitar um bocadinho as sortes que nos calham, é fixola.
qualquer tristeza apresentada a sorrir.
O que faço? Bem… sou ilustrador, quando tenho trabalho, e sou escritor, quando não tenho. Mas é costume uma coisa meter-se no caminho da outra. Ciúmes, e isso. Quando a ilustração e a escrita chegam a um acordo, felicidade e harmonia. Gosto de tangerinas descascadas ao fim da tarde, sentado numa cadeira aquecida pelo sol, a apreciar a lentidão da vida durante o Verão. Detesto que o Verão esteja a tornar-se uma criatura mitológica com avistamentos raros. E nabo, naturalmente. Detesto nabo.

A entrevista completa aqui.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

se querer fosse poder...

 imagem: Manuel Alves

Quando nascemos do lado errado da vida nunca achamos que cada um só tem a sorte merecida. Ninguém merece nascer apenas para morrer. Teria de haver muita culpa nessas almas, uma infinidade de actos grotescos em milhões de vidas anteriores para justificar o horror dos horrores. Um nado-morto, o sentido da vida com significado torto. Só todas as culpas do Universo têm razão para terminar uma esperança no início. Uma criança, nascida sem actos, nem mácula na memória, nem maldade no seu breve instante da História, sem parte na matança, nem a vergonha do vício. Uma criança, apenas e só. Excluída da sorte, sem dó.
Se é essa a sorte que cada um merece, as atrocidades convertem monstros em santos e tudo significa o contrário, pois a existência caiu no conto do vigário. A humanidade é uma palavra que morre e não deixa saudade. O sonho, por mais que combata tiranos, déspotas, fascistas e todas as falhas de carácter previstas, nunca alcançará a liberdade. A vontade de realizar o desejável será impossibilidade intolerável. Porque a sorte não é só a que merecemos. Umas vezes, procrastinamos e, contra toda a sanidade, alcançamos. Temos. Outras vezes, trabalhamos e, cumpridas as responsabilidades, falhamos. Perdemos.
A sorte é uma mentira cruel que mantém o azar fiel. A esperança diz-nos que não foi hoje, mas será amanhã. Melhor sorte virá. E continuamos a nossa afã, à espera do oxalá. A adivinhação do povo, das bocas de bruxos e adivinhos que sabem tudo de uma vida, antes da célula se multiplicar em ovo, mesmo os detalhes mais comezinhos. Mas eles não sabem nada, na sua sabedoria inventada. Pode lá saber-se o futuro antes de ele vir. É colher a flor e dizer que é fruto maduro, em essência, mentir. E quem for novo na vida, e não tiver experiência, acreditará em qualquer tristeza apresentada a sorrir.
Dizer que a sorte tem a medida certa é disparar projéctil que não acerta. A sorte é a convergência das circunstâncias, sem significado profundo. Não há ciência. É apenas o acaso do mundo. Nascer na riqueza não é nenhuma forma de grandeza. Quem não tem pão desaparecerá no mesmo chão.
A grande felicidade da vida é aproveitar a sorte merecida, não pensar em quem tem mais do que merece, e partilhar o possível com aqueles a quem a sorte esquece.